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segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Introdução

Cresci ouvindo que deveria procurar por minhas próprias pernas, enxergar pelos meus próprios olhos, falar unicamente por minha própria boca e procurar sentir por minha própria pele e memória. A dificuldade disto tudo está na seleção que precisamos fazer com todas as informações que nos são dadas, está também na conclusão que precisamos tirar das mesmas. 
Questiono esta forma de pensamento, que limita minha criação e desfaz meus caminhos, aqueles trieiros que sempre tenho tentado percorrer. É uma teoria aqui, uma certeza ali, outra verdade de cá. E isso tudo numa extensão magnífica de "talvezes", contradizendo inclusive aquilo que ouvi primeiro: fale, ouça, seja por você. A tarefa, no fim, talvez seja me descobrir no que os outros falam, na vivência dos outros, nas verdades dos outros. 
Começando por aí, preciso primeiro ver o que os outros disseram, dizem e no desespero contemporâneo de querer sempre saber mais e primeiro que os outros, sou pressionado a tentar adivinhar o que os outros ainda vão dizer. Depois, a passos largos para não atrasar mais do que já atrasei -no tempo de outros-, volto até minha experiência, por onde caminhei, onde caminho e pra onde estou indo, porquê é necessário, a todo custo, que criemos uma planilha, um mapa, listas, o que seja para nos afirmarmos, mesmo sem noção alguma de para onde queremos ir.
Depois deste desabafo, começo dizendo que meus processos, por mais que tentem publicar, é meu. E o mesmo está em constante mudança e reflete diretamente àquilo que estou lendo, estudando, fazendo. A tentativa de me privar das fendas, do escuro, do desconhecido Allan, tem, de uma forma ou de outra, criado uma pessoa que eu mesmo desconheço. Alguém capaz de responder mas incapaz de sentir. Portanto, por mais acadêmico este trabalho seja, me nego a escrevê-lo de tal forma. Porque existe uma forma, um modelo que facilita a vida de quem lê, mas nunca de quem precisa de fato o fazer: quem viveu antes para escrever.
Meu processo é assim, uma mistura de imagens, cores, sensações, cheiros, fedores, texturas, tentativas e erros. O caminho que trilho é incerto, como a própria criação. Tento não me apegar em tudo e desapegar do que realmente preciso o fazer. Crio outros caminhos, trieiros, pontes, ruas e avenidas se abrem nesse vazio cheio de informação. A obra vai tomando forma, se desmancha feito barro nas mãos do oleiro, se edifica feito pedra de Xangô, flui feito maré. Num mesmo lugar sou capaz de morrer e nascer mil vezes até o próximo passo, amadurecendo aquilo que é bagunçado, no entanto a coisa mais importante da minha vida. Me encontro no não-lugar, na não-existência me vejo existir.
Cadernos de outros, modelos criados por um e selecionados por outros para alguém. Quando me sento na cadeira da sala de aula -ou no chão- me sinto mais longe dos grandes mestres que leio ali. Não os encontro nas páginas que escreveram, mas no palco que subo e sinto na pele e na alma aquilo que cada um fala. Mestres, vocês não estão mortos, continuam vivos aqui. Não nas cartas e páginas que deixaram escritas mas nos sonhos artísticos, de jovens como eu, que não deixam apagar. A importância destas criaturas que há séculos vêm tentando mostrar que a experiência artística está na véspera, com o frio na barriga (desejo), e na hora da ação, quando deixamos de ser nós para sermos outro e só assim nos encontrarmos, está no conselho subentendido às páginas: vai dar tudo certo. Por mais perseguido que seja, ainda é possível.







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