Desculpa meu jeito. É que de onde eu venho. Será que importa mesmo pra você de onde eu venho? É que não consigo me explicar, se não considerar os caminhos de onde vim. Foi lá, naquele Planalto Central, que me percebi calango. Eu sou a terra vermelha que mancha roupa clara. Sou a areia fina que me lembra o mar que meus avós nem meus pais conheceram. Eu sou as pedras e sou também a água gelada que verte delas. Eu sou a humildade do cabreiro. E sou o deboche da puta do puteiro mais vagabundo. Eu sou o sertanejo, o tempo seco, a pele rasgada no duro pau retorcido. Eu sou o próprio pau retorcido. Eu rio de tudo mas não rio pra você. Rio por mim mesmo. Eu sou o deboche do caipira diante das certezas de vocês. Eu sou do meio do país. E recebo a herança da violência, das correntes que passam e derrubam tudo. Metade verde de soja, metade marrom de mato. Eu sou uma vaca mojada. Eu sou um perdido do mundo. Não levo seu desaforo comigo, te cuspo de volta em um olhar cínico, naturalmente. Eu sou latino-americano, brasileiro, tocantinense e goiano. Eu sou uma bichinha que sabia muito bem o que é liberdade. Eu sou a própria corrente que arrebenta suas impressões mais sinceras, que te confunde, que te mistura, que te encanta. Eu sou o próprio rio Araguaia, que banha tantas terras e abençoa. E mata. Eu sou o perigo das águas fartas que afogam e sou o perigo da pouca água que não sacia. Eu sou Marília Mendonça, sou a viola dos antigos, sou o batuque de um tambor aprendido fora e ressoado dentro de um casco de árvore frondosa. Por favor, desculpa meu jeito.
Bigode de Mutuca
Muita sensibilidade pra tão pouco eu lírico
sábado, 11 de novembro de 2023
segunda-feira, 11 de julho de 2022
A cara do futuro
O futuro virá
de dentro de um pote de barro
servido em canecas de ágate
por mãos iluminadas de sol e ouro.
O futuro será
de dentro de cabaças bem cuidadas
no fundo do rio mais antigo
pelas mãos mais iluminadas de sol e ouro.
O futuro terá cara do passado mais longínquo,
do presente mais eperado,
da velha. O futuro terá cara da velha!
terça-feira, 29 de setembro de 2020
caminhar
quinta-feira, 3 de setembro de 2020
Ansioso
Andando com os pé semi rachado.
Não à tôa, gosto de olhar a paisagem por onde ando. As pedras ou buracos do caminho às veiz passa desapercebidas. Olho de passarim, que parece que olha só pra cima. Mas se fosse de passarim mesmo, olharia pro chão, que é de onde vem a presa e o predador.
Se vi raíz, se vi folha, se vi fruta, rastejar na areia me ensinou olhar pra cima, me necessitou subir em árvores.
Foi quando te vi. E vendo e vendo, e olhando e olhando e sentindo todas as saudades do mundo, e a ansiedade principesca do tempo, aquela que é retardada pelo querer e não a passada do matuto, aquela que o desejo carrega o observar.
Como caminha o romântico, onde anda o livre no ser e estar sentir alguém. Poderia ser uma dúvida, imatura e cruel, de não ser e estar.
Hoje olhei a cidade e parecia mandinga de nego sabedor. Sabe? E parecia rodada de saia de pombagira laçadora. O sol queimava e mesmo assim, andavam da rua o povo. Senti você tão perto e onde você tá não era distante. Éramos. Era contigo.
Minha juventude, daquela qual nunca saí, mesmo com as dúvidas que sinto depois de fechar o terceiro ciclo. E quem conta essas coisas, gente?
Consigo imaginar coisas com você. E trens. E quereres ocultos aparecem no espelho. Eu quero. E se eu duvidar desse querer só um pouquinho, ele já me mostra, todas as malditas vezes, que quem está errado sou eu, não o desejo. E logo tudo passa, e os medos se esvaem, e água rola de novo, era uma pedra no meio da água. Peixe que nada. Cobra.
E ouvir o tambor, que me liga em mim, me liga a você. Uma força que existe e que sobe. Orgulho que sinto de ser parte dos seus passos. E belo é você que dança nas águas que eu nado. E de esquentar com óleo de dendê a pedra que eu deito.
Nós somos outono. E verão. E primavera todo dia que te vejo com os dente de fora. E inverno, só pra entender que o fogo antes de qualquer coisa, faz o mundo. E me faz em bracinhos de abraço, e peito de descanso, e corpo de lar.
Hoje vou triscar em seus ancestrais. E isso já faz de mim aquilo que sou. Com o passado temos o olho, as mãos presente e futuro todo passo que a gente dá pra sair de onde não deveríamos estar. Se tudo passa, que passemos pelo tudo sendo nós e juntim, Que eu te amo muito e desejo.
sábado, 22 de agosto de 2020
Como pode?
quinta-feira, 23 de janeiro de 2020
domingo, 12 de maio de 2019
Brisa
Eu amo tanto meu óculos preto q até esqueci do oto q sumiu apesar de tá falano nele agora lembrei bosta kkkk tô zuano kkkkkkkkkkkkkkkk . Kkk
terça-feira, 7 de maio de 2019
Rosa Caveira
Se tem pó que margeia o osso do defunto, sopra o vento da roseira, forte como uma esteira.
Espaço de lunação, retrato de fortaleza, a luz que brilha tanto vem de sua caveira.
Olha que sacode o pó que lá vem Rosa Caveira, mulher de 21 punhais e que é dona da porteira.
Ela é dona da calunga, da grande a pequena
De todo aquela terra ela é sua primeira.
Salve Rosa Caveira,
Que da lua tudo sabe
Na profundeza dos segredos
É com ela que se ajeita.
Senhora de tudo saber
Da força que usar
Do momento de agir
Da sagacidade de existir.
Quanto mais profundo é o poço
Mais difícil de escolher
Se a luz é uma rosa
Pra iluminar minha caveira
Ela usa de espelho
Sua própria beleza.
Ninguém fica sobre o pó
De dona Rosa Caveira
A Senhora da calunga
Tem sabedoria das estrelas.
quarta-feira, 24 de abril de 2019
Baseado na bazuca
Baseado na bazuca
Solta a fumaça
Da boca pro nariz
Prensa no braço
Onda bélica
Que exploda o mundo
De células amorosas
Que morram todas as outras.
Contradição?
terça-feira, 11 de dezembro de 2018
Base
Desaprendi a sentir
A diferença entre ser
E sentir a sentença.
Dois machados batem
Na porta na frente
Da fronte.
Inescrupuloso sentido
Surge no inconsciente
A resposta para o caminho.
sábado, 6 de outubro de 2018
ode a onda
terça-feira, 10 de abril de 2018
Da outra vez
Foi
tenho a impressão do gozo puro,
aquela sensação de transe.
Ritualisticamente profano.
De algum ponto,
tenho a lembrança de um carinho arrebatador,
muito mais que fraterno.
De nós faço essa síntese.
De mim, agora,
me acabo em mim mesmo.
É o fim do caminho.
É a pausa.
É a pedra de Drumond.
Pra ser, quiçá,
o passarinho de Bandeira.
segunda-feira, 18 de dezembro de 2017
S.E.T.E.
Mudança.
V.
Era um céu tão azul, um mar tão lindo, uma cerveja tão gelada e uma distância tão safada. Meu coração doía. Nem parecia o Rio, nem parecia eu.
VI.
Lar.
VII.
No tempo de um Lorenzo. Sete pontos pra trocar de pele. Sete tópicos pra marcar o tempo. Sete ponteiros do relógio da vida. Sete meses. Sete pontas. Sete forças angelicais. Sete sustos demoníacos. No sete roda o jogo, passa o susto, toma o sopro. No sete volta a andar.
sexta-feira, 24 de novembro de 2017
Conselhos
Te assegure no lugar que está, que o próximo passo está perdido.
Te assegure na sua infelicidade do agora,
naquela pequena parcela que te resta de sentir.
Sorria da desgraça encabeçada pela sua própria testa,
ou chore a culpa das estrelas.
Não espere pétalas quando esquecera de plantar a semente,
não espere vida onde cultuara a morte,
não espere luz na sala que você se encheu de cinzas.
Não se perca no toque,
que a pele alheia desbotara em suas mãos.
Não se demore no olhar,
que a distância vista se mostrará maior.
Não se encha de esperança,
que o amor acabou.
Só sobrou medo e dor.
E vontade de ajeitar. E medo e dor.
E vontade de voltar. E medo e dor.
E a vida continuando.
quinta-feira, 9 de novembro de 2017
Ao afeto
quarta-feira, 8 de novembro de 2017
animalia
terça-feira, 3 de outubro de 2017
Absurdo para se ler em sotaque português
sexta-feira, 8 de setembro de 2017
O ano que não choveu
Diziam que era presente, coincidência, recado ou aviso do céu. Tinha quem colocasse sagrado e profano no mesmo balaio pra falar daquela chuva. Eram os comentários que ele mais gostava, aliás.
Mas esse ano não choveu. Não caiu um pingo d'água, nem nuvem tinha lá em cima. Tudo seco. Nem suor lhe desceu a testa. Foi então que viu-se cerrado. Seco, esfumaçado, com marcas cinza na pele, feitas pelas unhas desidratadas. A água era interna, discreta. De tanto matutar, escolheu a resposta que mais lhe acomodara o coração quanto o atraso da chuva. É do fogo sua vida e seu renascimento.
Dá voltas no quarteirão a pele que deixa agora para trás, mais leve que quando o céu molhava agosto.
sexta-feira, 18 de agosto de 2017
O amor [que sinto]
algo de aceitar
a perda da sanidade
e aumento da dor selvagem,
como batida em moleira de criança,
parada cardíaca demorada.
se assegure no futuro,
que o passado não existe
e o presente machuca
que nem arame farpado preso
em dedo sem sapato,
choque de fio desencapado.
que nem pinto atropelado.
Tal qual queda de penhasco,
só que nunca chega o chão.
o amor do coração,
nêgo gela as canelas,
sua pelas mãos.
Faz de prece a oração
pra Deus dar um jeito no destino
e manter a união.
domingo, 6 de agosto de 2017
Sopro
segunda-feira, 31 de julho de 2017
Goiânia, 2017
Academia tocava no alto.
O uai achou o
que faltava no vocabulário
afetivo.
Fez chover,
Fez amor,
Fez força
tirando confete do ouvido!
domingo, 30 de julho de 2017
De nada
nóis nada.
Se o vento parar,
nóis sopra.
Se o tempo correr,
nóis espera.
Se o carinho estancar,
nóis ama.
De nada em nada
nóis nada.
nóis esquenta.
Se a chama aumentar,
nóis incendeia.
Se a cinza sobrar,
nóis queima.
Se a pedra rolar,
nóis pula.
De nada em nada
nóis continua nadando.
nóis tudo.
quinta-feira, 22 de junho de 2017
Abiãn
O abiãn que lava a casa, que rastela o quintal, que lava a louça, pra que os orixás sejam louvados na melhor das condições, enquanto os mais velhos no santo possam cozinhar, dar banho, dar santo.
O abiãn renova as esperanças, os desejos que vão se confundindo com o tempo, a paciência que vai se perdendo com a experiência. Nada no terreiro se confunde ao olho brilhante do abiãn apaixonado pelo santo.
Abiãn canta confuso, grita na hora que não devia, bate cabeça onde não carece. Abiãn ri das bobeiras que dá. E olhando pra eles, conseguimos nós que já casamos com o orixá, perceber o quanto o tempo e as responsabilidades nos fizeram carrancudos, ou metidos, ou prepotentes.
Abiãn é a energia do mundo, o começo, o frio na barriga, o olho brilhante, a curiosidade, o riso, a empolgação. Abiãn é aquele que está pra aprender, mas em silêncio deixa o segredo de quem também ensina.
Motumbá aos abiãns, que renovam minha fé todo dia, nas perguntas mais bobas, nos sentimentos mais sinceros, nas dúvidas mais simples. Na força do princípio da ancestralidade.
Se você não é do candomblé, abiãn é a pessoa que chega no terreiro e ainda não se iniciou, ainda não se tornou iaô.
segunda-feira, 5 de junho de 2017
clichê
Me trouxe um frio
Na barriga
E um calor
No coração.
Se quero o cafuné deixo o beijo,
se quero o oi deixo o adeus,
se quero a saudade deixo o abraço.
Um surto de paixão
me trouxe o riso
de canto
e um brilho
nos olhos.
terça-feira, 30 de maio de 2017
Quando o mundo acabar
terça-feira, 23 de maio de 2017
As Mulheres
Tinha uma mãe. Outra me amamentou. Outra servia o escaldado.
Já foram três.
Moço, quando eu parti o joelho no meio, minha vó que me segurava no colo dela.
Quando eu senti fome, fugindo da cronologia, minha tia me amamentou.
Eu lembro de cada professora que eu tive.
Cê pira?
E da menina que eu escrevi uma carta e ela nunca me respondeu?
Até me abraçou no outro dia como se nada tivesse acontecido.
Quando eu desmaiei quando, por leseira, bati na pilastra, foi a Lígia que me segurou a onda.
Tudo girava.
Antes de ir pra escola, foi a Maura que me levou.
Paixão infantil é bom porque a gente não lembra depois.
Minha tia era minha professora, e foi a primeira vez que eu fui pra coordenação.
Tinha uma muda também.
E um pé de amora.
A Bruna.
A amiga que morava com a mãe no barraco de adobe.
Mãe de sangue.
Mãe de leite.
Mãe avó.
Mãe de Cristo.
Mãe de Santo.
Mãe gira.
Dama da Noite.
Maria Padilha.
Sete Saias.
Rainha.
Uma mais santa que a outra.
Moço, moleque levado, com tantas madrinhas.
Na fogueira são duas vezes.
Madrinha que cortava meu cabelo. Quem botou a mão na minha cabeça pela primeira vez.
Madrinha do supermercado. Minha lembrança do ovo de páscoa.
Madrinha da cidade onde eu nasci. Quem me esperou.
Madrinha da fogueira, onde renovou nosso laço no fogo.
Madrinha do rio. Da água. Da calma. Da proximidade ancestral.
Madrinha entidade.
De fora as amigas.
São tantas.
Esqueço do nome, mas nunca da cara.
Nem do carinho.
Nem do caminho.
Agradecido.
segunda-feira, 15 de maio de 2017
Conspiração parabólica
quarta-feira, 10 de maio de 2017
7 coisas que meu celular, a internet e meus perrengues me ensinaram
quarta-feira, 3 de maio de 2017
Vi a mãe
Meio confuso,
que nem maré alta
que bate em pedra
que arrebenta muralha.
Hoje vi Iemanjá em mim,
que cuida de minha cabeça
que dá colo de mãe
e canto de sereia.
Deixa cair pra ver o choro
e o aprendizado.
Bagunça as vistas,
que nem água salgada.
Nas minhas lágrimas
mato minhas saudades de Iemanjá.
Saúdo o mar,
e o rio que cultuam Iemanjá.
Salve a mãe cujo filhos são peixes,
Senhora do espelho de prata,
Rainha do mar.