Som
de floresta. Bichos diversos. Pássaros, mamíferos, feras. O som vai
aumentando.
Palco
vazio. Luz baixa, esverdeada.
Entra
Flávia, desconfiada, olha para a plateia, vai até o meio e volta a
se esconder.
Entra
Régis, do outro lado do palco, também desconfiado. Régis carrega
numa das mãos pedras. Volta correndo pra coxia novamente.
Entra
Flávia e Régis, muito desconfiados de costas um para o outro. Param
a certa distância um do outro, e ainda de costas, dão um grito
gutural. A música cessa. A luz aumenta.
Flávia:
Chega!
Régis:
Já viu?
Flávia:
Não, cansei.
Régis:
Flávia, não dá pra cansar na selva.
Flávia:
Eu cansei. Que me comam. Que me matem. Não vou correr.
Régis:
Agora não vão querer mais. (Sorri)
Flávia:
Me entreguei, né? Vão me apedrejar, “a oferecida da mata”.
Régis:
Piriguete selvagem. (Gargalham)
Flávia:
Essas coisas são malucas. Pensa comigo, são todos ditos selvagens,
respondem por seus instintos, gritam com você, cospem na sua cara,
te perseguem, te batem, te matam. São animais, então está tudo
certo.
Régis:
É isso. A partir de hoje sou um animal. Um bicho.
Flávia:
O quê?
Régis:
É isso, se não posso sendo diferente, usarei o mesmo direito. Serei
igual. (Gritando para que todos ouçam) A partir de agora estou do
lado dos animais selvagens, daqueles que bradam aos quatro cantos sua
intolerância com bichos menores. Bato no peito.
Flávia:
Régis, que vexame.
Régis:
Você vai ver. Desculpa, agora você está sozinha. Passei pro lado
deles.
Flávia:
Régis, até afeminado você é. Pára com isso.
Régis:
Vou falar com o gorila, avisá-lo que sou da parte selvagem. (Sai)
Flávia:
Que coisa não? Régis agora é macho selvagem. É um direito. Só
quero ver como ele vai lidar com essa situação quando mandarem ele
ir lá na casa dos pais dele... coitada da mãe. Ah, qualquer coisa é
só fazer como ele, sejam selvagens, seja igual os outros e não
sofrerá.